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A Arbitragem nos Contratos de Franquia: uma análise das desvantagens da Cláusula Arbitral para Microfranquias

A utilização da arbitragem para resolver disputas oriundas de contratos de franquia tem sido um tema amplamente debatido no contexto jurídico brasileiro. Com a promulgação da Nova Lei de Franquias (Lei 13.966/2019), as incertezas sobre a sua aplicabilidade foram dissipadas, uma vez que a nova legislação reconhece explicitamente a possibilidade de as partes optarem pela arbitragem. 

Nos últimos anos, o franchising tem se destacado como uma alternativa atrativa para empreendedores, oferecendo a oportunidade de ingressar no mercado com o respaldo de uma marca estabelecida e um modelo de negócio comprovado. As microfranquias, com investimento inicial estimado em até R$ 135 mil, têm ganhado popularidade por serem mais acessíveis financeiramente e por oferecerem um ponto de entrada mais seguro no mundo dos negócios.

Apesar dos benefícios potenciais, os contratos de franquia podem ser complexos e apresentar desafios significativos, especialmente no que diz respeito à resolução de disputas. Neste artigo, vamos explorar brevemente os desafios enfrentados pelas microfranquias ao lidar com a cláusula arbitral nos contratos de franquia. 

 

Contratos de Franquia 

Os contratos de franquia são documentos complexos e detalhados, que estabelecem os direitos e responsabilidades tanto do franqueador (a empresa matriz que possui a marca e o modelo de negócios) quanto do franqueado (o indivíduo ou empresa que adquire o direito de usar a marca e o modelo de negócios). 

O franchising tem se revelado um setor promissor tanto no mercado global quanto no Brasil. Um dos principais impulsionadores desse crescimento contínuo é a crescente disposição dos brasileiros para empreender, aliada à segurança oferecida pelo modelo de franquias em comparação com o lançamento de empresas independentes. 

Segundo a Associação Brasileira de Franchising (ABF), o setor de franquias demonstrou grande crescimento em 2024. Somente no primeiro trimestre do ano, houve um impressionante crescimento de mais de 19%. O número de redes de franquia também tem aumentado, refletindo a entrada de novas marcas no mercado. Segundo a ABF, “a variação no primeiro trimestre de 2024, representou um acréscimo de 7.473 operações de franchising no país em relação ao mesmo período de 2023, totalizando 191.376 operações”. 

Essa expansão do setor, porém, traz consigo um conjunto de desafios, especialmente para os franqueados menos experientes. Em muitos casos, os contratos de franquia são redigidos pelo franqueador e apresentados ao franqueado em uma base de “pegar ou largar”, deixando pouco espaço para negociação. Por isso, mesmo que os contratos de franquia reflitam uma relação empresarial, e não de consumo, grande parte da doutrina e da jurisprudência pátria os consideram como contratos de adesão, justamente por, em diversas ocasiões, não oportunizarem negociação das suas condições. 

Esse contexto tende a criar uma assimetria de condições entre as partes, especialmente considerando que a maioria dos novos franqueados são pessoas que têm pouca ou nenhuma experiência com negócios empresariais. Segundo dados da Associação Brasileira de Franchising (ABF), 55% dos franqueados no Brasil são empreendedores sem nenhuma experiência, ou ainda empresários iniciantes.

Valendo-se disso, é comum no mercado de franquias que franqueadoras se utilizem dessa disparidade de condições técnicas/intelectuais para pressionar novos franqueados a assinarem contratos de franquia sem a devida revisão ou compreensão, para supostamente evitar a perda da “oportunidade” de negócio. 

A falta de compreensão das regras contratuais pela parte hipossuficiente na relação – no caso, o franqueado – se estende à falta de discernimento sobre a opção pelo juízo arbitral nos contratos de franquia. Percebe-se que, na prática jurídica do mercado de franquias, a maioria absoluta dos franqueados, ao assinarem contratos de franquia com “cláusula arbitral”, não compreende os efeitos dessa escolha, e, principalmente, ignoram que estão renunciando ao direito de ingresso com ação na “justiça comum”, para a hipótese de conflito com a franqueadora. 

Tal situação revela um cenário preocupante, especialmente para franqueados com menor capacidade financeira, visto que os custos envolvidos em um procedimento arbitral na maioria absoluta dos casos inviabilizam por completo a utilização da arbitragem como meio efetivo de resolução de conflito por parte do franqueado.

Na prática, nota-se que as empresas franqueadoras, sabendo dessa realidade, têm se utilizado desse mecanismo para impedir os franqueados de acessarem o Poder Judiciário, minimizando seus riscos jurídicos. Ao aderir à cláusula arbitral sem o real conhecimento sobre seus efeitos, o franqueado com menos condições econômicas acaba tendo tolhido o seu direito de pleitear em juízo na hipótese de descumprimentos legais ou contratuais pelas franqueadoras. 

Não obstante esse cenário específico no meio do franchising, a arbitragem é promovida como uma alternativa eficiente e especializada para a resolução de disputas, e seu funcionamento e aplicação nos contratos de franquia serão discutidos a seguir.

 

A Arbitragem como Resolução de Conflitos nos Contratos de Franquia 

A arbitragem é um dos métodos adequados de resolução de conflitos em que as partes envolvidas, de comum acordo, submetem sua controvérsia à via arbitral, em vez de levar o caso aos tribunais tradicionais, desde que decorrente de direito patrimonial e disponível. A arbitragem é escolhida por muitas partes devido à sua eficiência, confidencialidade, agilidade e flexibilidade. 

Inicialmente, é essencial esclarecer o significado da chamada “cláusula arbitral” e como isso afeta diretamente a dinâmica das franquias. Quando inserida no contrato, essa cláusula estabelece que as questões disputadas serão resolvidas prioritariamente por meio de arbitragem, de acordo com a Lei nº 9.307/1996 (Lei de Arbitragem), em detrimento de serem levadas a um tribunal judicial.

Os tribunais brasileiros gradualmente reconheceram a validade da cláusula arbitral em contratos de franquia, desde que atendidos os requisitos legais da Lei de Arbitragem. Agora, as partes têm o respaldo legal para eleger o juízo arbitral como método de resolução de disputas, oferecendo uma alternativa eficiente e especializada aos tribunais judiciais. 

Em contratos de adesão, a eficácia da cláusula arbitral está condicionada à iniciativa do aderente (neste caso, franqueado), ou, desde que ela esteja disposta em destaque no contrato, em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou visto específico para essa condição, nos termos do artigo 4º, parágrafo 2º, da Lei de Arbitragem.

 

Desafios da Arbitragem para Micro e Pequenas Franquias

Embora a arbitragem seja frequentemente promovida como uma alternativa mais rápida e econômica aos processos judiciais tradicionais, ainda pode ser uma opção dispendiosa, especialmente para os casos das microfranquias, cujo investimento de implantação, como dito, é de no máximo R$ 135 mil. As taxas de arbitragem, honorários de árbitros e outros custos associados podem representar um ônus significativo para essas empresas, tornando a arbitragem financeiramente inviável em alguns casos. 

Além disso, empresas menores e com menos condições geralmente têm menos acesso a recursos jurídicos especializados, de forma que participar efetivamente de um processo de arbitragem pode ser um enorme desafio. A falta de experiência e conhecimento legal pode colocar essas empresas em desvantagem durante o processo, afetando suas possibilidades e a obtenção de resultados favoráveis. 

Vale notar que, quando as partes optam contratualmente pela via arbitral, passa a incidir o “Princípio da Competência-Competência”, o qual determina que é o próprio árbitro a autoridade competente para decidir sobre a validade ou não da cláusula arbitral. 

No entanto, essa regra cada vez mais vem comportando exceções. Em alguns casos, a cláusula arbitral poderá ser sujeita a nulidade, quando identificada que a cláusula de arbitragem é patológica, ou seja, está redigida de forma deficiente, ambígua ou incompleta, de modo que cria dificuldades na interpretação e implementação do procedimento arbitral. Essas cláusulas podem levar a incertezas e litígios sobre a validade, aplicabilidade ou execução do acordo de arbitragem 

Nessa linha de entendimento, a Terceira Turma do STJ firmou o entendimento no sentido que cabe ao Poder Judiciário declarar a nulidade da cláusula compromissória quando identificar o compromisso claramente ilegal (AREsp 1560937/SP), ou seja, que não obedece aos requisitos do parágrafo 2º, artigo 4º, da Lei de Arbitragem.

 

Cuidado e atenção: nunca é demais!

Embora a arbitragem possa oferecer uma alternativa atraente para a resolução de disputas nos contratos de franquia, os desafios enfrentados por microfranquias não devem ser subestimados. Para maximizar os benefícios da arbitragem e mitigar seus desafios, é essencial que essas empresas recebam o suporte adequado durante todo o processo, desde a negociação do contrato até a execução de uma decisão arbitral. Além disso, é importante que os legisladores e as partes interessadas considerem maneiras de tornar a arbitragem mais acessível e eficaz para microfranquias, garantindo que essas empresas possam proteger seus interesses e resolver disputas de maneira justa e equitativa.

Para concluir, é crucial que as partes envolvidas em contratos de franquia de fato compreendam os detalhes e implicações da inserção de cláusulas de arbitragem, especialmente em relação à renúncia pela opção ao poder Judiciário. A consulta a um advogado especializado e de confiança pode fornecer orientações personalizadas e garantir que a cláusula seja redigida de acordo com os requisitos legais, mitigando assim potenciais desafios legais no futuro

Portanto, recomenda-se enfaticamente que os interessados busquem aconselhamento jurídico especializado antes de proceder com a inclusão de cláusulas de arbitragem em contratos de franquia.

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Autores: Ricardo Dalla Roza Schiavo e Sophia Martinelli

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